quarta-feira, 9 de maio de 2012

Refletindo a linguagem na escola


“Ler fluentemente e gostar de ler, entendendo tudo o que lê é o padrão vigente? Ter facilidade para expressar as idéias e escrever bem é o normal entre  os estudantes? Não seria este o momento de repensar o ensino da língua?”.


Quando se aprende uma língua, entra-se em contato com uma das formas mais bem estruturadas de comunicação. Ao mesmo tempo, aprende-se a pensar. Ora... pensar é agir de forma operativa sobre as coisas, é compreender a realidade e ser capaz de interferir sobre ela. A língua, enquanto uma forma de linguagem, constitui-se no centro do processo educativo, a principal responsável por essa dinâmica e é um dos elementos indispensáveis aos processos cognitivos mentais.

A escola nesse contexto, não é o único instrumento de propulsão da comunicação, mas é principalmente nela, que o indivíduo faz o aprendizado formal da língua, como uma estrutura organizada, o que lhe possibilitará a obtenção de elementos necessários à compreensão do espaço que o rodeia, à expressão de sua afetividade e o acesso ao mundo do conhecimento.

Este fenômeno ocorre quando o ensino da linguagem visa especialmente ao aprimoramento máximo da capacidade de comunicação do aluno, seja no campo da leitura seja no campo da expressão oral, ou escrita. É quando transcendem os limites da própria disciplina, transpondo seus umbrais e materializando a grandeza de sua abrangência, em todas as áreas de estudo.

O desenvolvimento da expressão escrita não se faz certamente através do ensino mecânico da ortografia ou do aprendizado das regras gramaticais. Expressar-se bem na escrita é o resultado de um longo e intenso uso da linguagem, em seu aspecto mais enriquecedor; a leitura.
Porém, quase tudo o que se faz pela expressão escrita no Brasil tem sido carregado de falhas e distorções.

Como exemplo ilustrativo temos o esquema de correção usado por milhares de professores, que é altamente castrador e estigmatizante, seja do ponto de vista  do uso da caneta vermelha que ressalta os erros cometidos, seja pelos critérios de julgamento, via de regra subjetivos.

Há milhares de casos em que o indivíduo odeia escrever e se recusa taxativamente a fazê-lo, alegando incompetência, apenas porque, no início de sua escolarização passou por um processo traumático que o levou a pensar: “ Quanto menos escrevo, menos erros cometo e menos sou corrigido”.

Esse crime vem sendo perpetrado há séculos, no entanto bastaria uma releitura dos objetivos da correção. Corrigir não é apontar o erro! É oferecer ao aluno a oportunidade de conhecer o desconhecido ou reaprender o que não foi sistematizado e permitir que ele tenha coragem para exprimir o que sente, acha e conhece como forma inclusive de poder conhecer mais. Esse prazer de ampliar seu horizonte cognitivo também está ligado à possibilidade de expressar o conhecimento e confrontá-lo com o de outras pessoas.

É justo mensurar e avaliar comparativamente duas redações sobre o mesmo tema escritas por pessoas com vivências e repertório diversos?.

Ninguém cobra de um Picasso os traços de um Michelângelo, como não se comparam qualitativamente o estilo e a criação de um Van Gogh com os de um Manet, porque pintura é arte e arte é individual.

Nem todos os seres humanos podem ser bons pintores, mas há aspectos pertinentes ao campo do desenho que podem ser ensinados, tais como: proporção, perspectiva, mistura de cores, definição de planos, relação de figura e fundo na superposição de imagens. Haverá certamente quem faça melhor uso desses conhecimentos e quem possa  desenvolvê-los mais criativamente. Porém, não é cabível esperar que todos sejam grandes pintores.

Um romance, um poema, uma crônica, são expressões artísticas da linguagem escrita e como tal devem ser encarados. O prosador e o poeta são indivíduos dotados da mesma capacidade de criação de pintores, escultores e músicos. Os literatos porém, utilizam letras e palavras para expressar suas emoções. Respeitado este paralelismo, o que se pode cobrar de um estudante numa redação, que seja passível de julgamento ou nota? Apenas os aspectos comuns a todos. Aquilo que, ensinado num espaço escolar pode ser aprendido: ortografia, acentuação, concordância, regência, pontuação, clareza de expressão, coerência, concatenação de idéias, seqüência lógica e nível semântico. 

Exigir que todo estudante seja um Machado de Assis ou um Carlos Drumond de Andrade é desconsiderar e empobrecer a genialidade criativa de um escritor.

Estilo e criação pertencem ao âmbito exclusivamente pessoal e são imensuráveis.
Urge que a escola retome rapidamente a discussão sobre a linguagem.

Neda Lian Branco Martins
Presidente do Conselho Consultivo e Fundadora do Grupo A
Autora do livro Em Busca da Escola Ideal

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